1º quadrimente 2024

Felícia Leirner teve seu contato com a arte ao acompanhar algumas das aulas de desenho e pintura da filha Giselda. Aos 44 anos, atraída primeiramente pela pintura, passa a frequentar o ateliê de Yolanda Mohalyi, da qual restou, entre as poucas obras que realizou, um retrato de seu marido.

Foi pelas mãos de Elisabeth Nobiling, artista e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, que Felícia conheceu a escultura e escolheu esse meio como sua principal expressão. Por meio da técnica da modelagem a artista desenvolveu sua habilidade de dimensionar formas.

No contexto da arte brasileira, entre os anos de 1930 e 1940, a vertente escultórica mais legitimada no país era a do “modernismo classicizante”, devedor das lições de Bourdelle, Maillol e Despiau. Segundo a doutora em estética e história da arte, Marina Cerchiaro, boa parte dos escultores modernistas brasileiros atuantes nessa época, na maioria homens como Celso Antônio, José Alves Pedrosa, Bruno Giorgi e Joaquim Figueira, trabalhavam o volume, buscavam a solidez, a simplificação e a integração do todo, concentrando-se no bloco, sem se preocupar com detalhes (CERCHIARO, Marina. 2020, p. 20).

Esse período também foi marcado por outras correntes estéticas na produção escultórica como o expressionismo e o surrealismo. O aumento expressivo de mulheres escultoras também chama a atenção.

Em 1948 Felícia foi aceita como aprendiz no ateliê do escultor Victor Brecheret. De acordo com a crítica de artes visuais Angélica de Moraes, a fase final e mais vigorosa da produção de Brecheret foi quando ele se aplicou em entender as essencialidades de Henry Moore e Brancusi que o levariam a quase transpor de vez a fronteira para arte abstrata (GUINSBURG, 2014.p.127).

Ainda segundo a autora, é justamente nessa fase de Brecheret que Felícia foi sua aluna, tendo acumulado as bases de um repertório visual.

As primeiras produções de Felícia datam da década de 1950 e giram em torno das temáticas da mulher, da maternidade, do universo familiar e da natureza, tendo sido representadas por meio da figuração, ou seja, de formas que conseguimos reconhecer diretamente.

A obra intitulada “Figura Clássica (estudo)”, de 1950, que abre o percurso expositivo do Museu, demonstra a proximidade entre aluna e professor. Nessa obra vemos características semelhantes ao “Torso Feminino”, produção de Brecheret de 1939.

Segundo Moraes, Felícia soube fazer sua arte dialogar com a produção de diversos autores-chaves para o estabelecimento e consolidação do vocabulário escultórico moderno (GUINSBURG, 2014. p. 126).

A calma e a sensualidade combinada às conexões anatômicas e a sólida disposição de formas são características de Maillol, Marino Marini e Lembruck, que podemos observar na obra “Mulher reclinada” de Leirner, com datação entre 1950 e 1955 (MORAIS, 1991. p. 89).

Já as formas diretas e as linhas alongadas são influências de Henry Moore e Giacometti, como podemos observar, por exemplo, na obra intitulada “Homem” produzida por Felícia entre 1950 e 1955 com braços e pernas mais finos e alongados junto ao corpo (MORAIS, 1991. p. 89).

Dentre as produções dessa fase, chama-se atenção para a obra “Moça em Pé”, de 1954, que foi premiada na terceira edição da Bienal de São Paulo (1955) com o Prêmio Aquisição MAM-RJ, sendo vendida ao Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.

Outros artistas por quem Felícia manteve vivo interesse foram: Gabo, Pevsner, Max Bill e Lachaise (GUINSBURG, 2014. p. 130).

As obras dessa fase possuem um movimento sutil graças ao toque de modernidade dado por Felícia em suas composições verticalizadas e esguias de rostos miniaturizados como forma de acentuar o volume do corpo (MORAIS, 1991. p. 90).

Referências:

CERCHIARO, Marina. Escultoras e Bienais: A construção do reconhecimento artístico no pós-guerra / Marina Cerchiaro; orientador Ana Paula Simioni. São Paulo, 2020.

LEIRNER, Felícia. Textos poéticos e aforismos. Org. J. Guinsburg e Sergio Kon. São Paulo: Perspectiva, 2014.

MORAIS, Frederico. Felícia Leirner: a arte como missão/ Frederico Moraes – Campos do Jordão, SP: Museu Felícia Leirner, 1991.

SOUZA, F. O. N. . Experiência imigrante e estratégias de inserção no campo artístico: a trajetória do casal Isai e Felícia Leirner em São Paulo. In: IV Colóquio de Teoria, Crítica e História da Arte – Reflexões sobre as possibilidades da história da arte, 2019, Brasília. Anais do IV Colóquio de Teoria, Crítica e História da Arte – Reflexões sobre as possibilidades da história da arte. Brasília: Universidade de Brasília, 2019.

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Instituto Moreira Salles Rio de Janeiro, Brasil · Título: Felicia Leirner, São Paulo, SP. Brasil · Criador: BrillAlice. Circa 1951. Disponível em: <https://artsandculture.google.com/asset/felicia-leirner-s%C3%A3o-paulo-sp-brazil/mwFBaqF-LbDdcghttps://artsandculture.google.com/asset/felicia-leirner-s%C3%A3o-paulo-sp-brazil/mwFBaqF-LbDdcg> Acesso em: 01/02/2024