3º Trimestre | 2017

Na última edição do Notícias de Acervo apresentamos o processo de recuperação da obra Moldura – escultura que faz parte da última fase da artista, sido criada em 1982, no espaço do próprio Museu. A obra, que explicita a poética da artista no que tange a íntima relação entre suas criações plásticas e o meio natural circundante, foi criada em argamassa armada e revela o amadurecimento do trabalho artístico de Felícia Leirner com o uso desse material. Nesta edição será exposto o processo de restauro e recuperação de algumas esculturas em bronze pertencente à coleção, tendo em vista que a sua recuperação requer passos bem objetivos. Lembramos, ainda, que esse material é bastante conhecido pela sua resistência e, por isso, muito utilizado em obras de arte criadas para exposição ao ar livre. Embora sua exposição à intempéries não o destrua em velocidade perceptível, ela provoca modificações bastantes visíveis em sua estética, com a mudança constante na coloração e até na textura – pátina. 

De modo geral, os fatores ambientais que interferem na conservação de obras de arte ao ar livre estão relacionados aos níveis inadequados de umidade, temperatura, luz, sujidades em deposição (poeira, resíduos vegetais etc.) e gases contaminantes. As ocorrências mais nocivas são aquelas decorrentes do contato com os animais, desde insetos e roedores, até a ação do próprio ser humano. Mais detalhadamente, os agentes que ameaçam a integridade das obras de bronze expostas à céu aberto são basicamente:

– O acúmulo de água e sujidades (poeira, resíduos vegetais etc.) em partes específicas das obras;

– A movimentação do solo e o consequente abalo das bases das esculturas, causada por erosão ou crescimento de raízes de árvores;

– A presença constante de insetos e pequenos animais que agridem a pátina do bronze, pois pressupõe a presença constante de resíduos como dejeções, ovos e casulos;

– A oxidação da estrutura;

– Acidentes físicos e químicos que podem ocorrer a qualquer momento.

Como citado no material anterior, quando os conservadores-restauradores do escritório Julio Moraes iniciaram o trabalho junto ao Museu Felícia Leirner, o estado degradado das obras de arte da coleção exigiu paciência e muito conhecimento técnico para serem recuperadas. Conhecer a artista e seu processo de produção, compreendendo as técnicas por ela empregas, foram os primeiros passos desse trabalho, que resultou na recuperação total das 84 esculturas até então pertencentes à coleção. Lembramos que o restauro das obras da coleção iniciou-se em 2008, pelo esforço da ACAM Portinari. Naquele momento, o estado de degradação das obras não permitia a simples intervenção paliativa, mas necessitava de intervenções significativas para a sua recuperação estrutural. De uma maneira geral, todas as esculturas em bronze foram identificadas naquele momento com os mesmos problemas de conservação: pátina irregular (provocada pelo contato humano); escorridos na pátina por dejeções de aves e outros animais; e presença de insetos e seus derivados (dejeções, ovos, casulos etc.).

As intervenções básicas incluíram limpeza mecânica e química com uso de detergente não iônico, escovas macias e com hidrojateamento de pressão controlada; a regularização da pátina com uso de cera pigmentada; e uma aplicação de camada de proteção com uso cera micro-cristalina. Importante destacar que, ao repor ou intervir na pátina, foi necessário compreender os materiais e técnicas utilizados pela artista, buscando não provocar nenhum tipo de alteração posterior na obra, e a manter estável ao utilizar materiais próximos daqueles utilizados originalmente. Algumas correções nas bases de obras também foram necessárias, como a substituição parcial da alvenaria e camada de concreto, além de tratamento com aplicação de fungicida, de forma a garantir a sua estabilidade e preservação, e a segurança dos passantes (visitantes e funcionários).

Após a recuperação da coleção, rotinas de manutenção foram estabelecidas, incluindo o acompanhamento diário de seu estado de conservação, com a retirada de água e sujidades acumuladas superficialmente, bem como identificação e notificação de possíveis agressões à pátina, minimizando seus efeitos. A visita mensal da equipe de especialistas inclui a limpeza com hidrojateamento e a recuperação da pátina com a aplicação de cera pigmentada e camada protetiva capaz de evitar agressões mais superficiais.

Vale lembrar, ainda, que ações mais invasivas, quando necessárias, devem ser guiadas por rígidos critérios éticos e técnicos, para que seja evitada qualquer alteração nas características conceituais e materiais da obra.